Segunda matéria da série mostra como a participação nas eleições pode proporcionar melhorias à sociedade
No dia 6 de outubro, mais de 156 milhões de eleitoras e de eleitores poderão comparecer às urnas e votar em candidaturas para os cargos de prefeito e vereador. No total, 5.569 municípios participarão das Eleições Municipais de 2024. Ficam de fora do pleito o Distrito Federal e Fernando de Noronha (PE).
Ao longo desta semana, o Portal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) publica a série “O que o eleitor quer quando pensa em democracia?”. Nesta segunda matéria, confira as expectativas do eleitorado com relação a propostas que poderão culminar em melhorias na área da educação.
Importância da educação para o exercício da cidadania
É por meio do processo democrático que são apresentados as candidatas e os candidatos e que são eleitas as pessoas que ocuparão as prefeituras e câmaras de vereadores pelos próximos quatro anos. Em uma eleição, todas as pessoas estão em posição de igualdade e unidas em prol de um propósito em comum. O voto tem o mesmo peso e o mesmo valor para cada eleitora ou eleitor.
Ter acesso a um ensino de qualidade é um aspecto fundamental para a formação de adultos conscientes dos seus direitos e deveres enquanto parte de uma sociedade. Também é por meio da educação que aprendemos sobre a importância do preparo para o pleno exercício da cidadania, da representatividade nas esferas de poder e da participação ativa no processo decisório de um país.
De acordo com o cientista político Murilo Medeiros, da Universidade de Brasília (UnB), a participação das eleitoras e dos eleitores na discussão, na formulação e na fiscalização de políticas públicas também fortalece o vínculo entre as escolas e a sociedade. “O engajamento da comunidade reforça o compromisso com a educação e estimula a valorização da agenda educacional nas ações públicas municipais”, analisa.
A Constituição Federal (artigo 205) estabelece a educação como direito de todos e dever do Estado e da família. No Brasil, conforme determinado pela Carta Magna (artigo 211, parágrafo 2º), os municípios devem atuar prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.
Nesse sentido, em setembro de 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a educação básica constitui direito fundamental de todas as crianças e todos os jovens. Também estabeleceu que o dever do Estado de assegurar o atendimento em creche e pré-escola às crianças de até 5 anos de idade é de aplicação direta e imediata, sem necessidade de regulamentação pelo Congresso Nacional.
Segundo o cientista político, a decisão do Supremo reforça a responsabilidade federativa do município na oferta da educação de base, que passa pela creche, pela pré-escola e pelo ensino fundamental. Para ele, prover um processo de aprendizagem de qualidade é um desafio para todos os entes de governo, em especial os municipais, que sofrem com limitações financeiras rotineiramente.
“Os municípios devem estar atentos a alguns pontos para a devida prestação dos serviços educacionais de sua competência, como o transporte escolar, a merenda dos estudantes, a qualidade do ensino e o financiamento, que abrange o salário dos professores”, explica.
Contudo, na avaliação de Medeiros, o contexto é paradoxal, uma vez que os repasses financeiros necessários para o custeio do ensino básico não acompanham o progressivo aumento das atribuições municipais na área da educação.
O que a eleitora quer quando pensa em educação?
Pelo alto grau de relevância, esse é um dos temas que mais desperta interesse no eleitorado e pode exercer um grande papel de influência na escolha de representantes nas Eleições Municipais de 2024.
Na opinião do cientista político Murilo Medeiros, a priorização de investimentos na educação infantil é fundamental para o crescimento econômico de qualquer país, pois há um alto retorno financeiro para cada valor investido nas crianças quando se leva em conta o aumento da escolaridade, do acesso a serviços públicos e dos índices de superação da pobreza.
Ele relata que estudos internacionais já indicaram que cada US$ 1 (dólar) investido em crianças nos seus primeiros anos de vida resulta em um retorno futuro de US$ 17 para a sociedade.
“Uma criança bem acolhida em creches e pré-escolas, posteriormente, será um estudante com notas mais altas e um trabalhador com mais chance de inserção no mercado de trabalho. Investir na educação infantil é o verdadeiro caminho da prosperidade nacional. Quanto mais cedo o investimento for feito, maiores as taxas de retorno proporcionadas ao país”, reflete.
Para entender o que o eleitorado quer quando pensa em educação, conversamos com duas mulheres que moram no Amazonas e são mães de crianças em idade escolar, mas têm realidades distintas. Uma delas vive na capital, Manaus, e a outra reside em Pauini, município do interior do estado.
Carla Machado é empregada pública e mora em Manaus. Passou em um concurso federal em 2006, pouco tempo depois de concluir o ensino médio, e considera que o fato de ter estudado em boas instituições possibilitou o ingresso no serviço público. “Sou filha de mãe divorciada, da classe econômica C. Não tinha roupas de marca, nem fazia viagens de férias na infância, mas sempre estudei em escolas de qualidade. Foi-me ensinado que a educação é a maior herança que se pode deixar para os filhos”, diz.
Assim como Carla, seu filho, João Pedro, de 11 anos, também estuda em instituição privada de ensino. Por acreditar que a educação é o único meio capaz de viabilizar uma sociedade mais justa e igualitária para todas e todos, ela considera o tema de extrema importância no debate político-eleitoral.
Assim, para a servidora, analisar as proposições das candidaturas e comparecer à seção eleitoral para votar permite a escolha de representantes mais alinhados com seus valores e objetivos. “Quando nos abstemos dessa escolha, abrimos mão dessa responsabilidade social e transferimos o poder de decisão a pessoas que muitas vezes não são orientadas a pensar no bem comum”, assevera.
Nas Eleições 2024, ela afirma que deseja a ampliação da presença de mulheres nos espaços decisórios e, dessa forma, busca candidatas que apresentem propostas para diminuir as desigualdades econômica, de gênero e racial. Como o município é responsável pela educação infantil e pelo ensino fundamental, Carla avalia que uma boa base pode evitar a evasão escolar, que reduz a escolaridade da classe mais pobre da sociedade.
“São as vereadoras e os vereadores que podem aprovar programas especiais de educação e destinar orçamento para o ensino fundamental. Além de ser o elo entre as outras esferas governamentais e a sociedade, essas pessoas são responsáveis por monitorar e fiscalizar a destinação dos recursos e a aplicação das políticas públicas. Em resumo, são essenciais para a promoção da qualidade de ensino entre crianças e jovens”, complementa.
Na avaliação de Carla, a infraestrutura é a principal distinção entre os estabelecimentos públicos de ensino de Manaus e os dos municípios do interior do Amazonas. Segundo ela, nas localidades isoladas, o número de escolas é consideravelmente menor, assim como a quantidade de recursos investidos na educação.
Diferenças entre a capital e o interior do Amazonas
Lídia Souza é artesã e atua como caixa de uma mercearia de Pauini, município localizado no sul do Amazonas, na região do Alto Purus, que fica a aproximadamente mil quilômetros de Manaus. Pela ausência de estradas que liguem Pauini a outras cidades, só há duas formas de se chegar até lá: por meio aéreo ou fluvial. De barco, o trajeto entre a capital do estado e o município sul-amazonense pode durar até uma semana.
Ela tirou o título de eleitor em 2015, aos 18 anos, em uma embarcação do governo estadual que percorria municípios do interior para atender a população que vive em comunidades mais isoladas. Só deixou de votar nas Eleições Gerais 2018 porque foi a Manaus para estudar e não transferiu o documento a tempo. Anos depois, voltou à cidade de origem.
Na opinião de Lídia, que é mãe de Maitê, de 1 ano e 7 meses, todos têm de estudar para serem pessoas “de bem” na sociedade. Por não ter idade para frequentar a creche municipal, que aceita crianças a partir dos 2 anos de idade, a menina ainda não iniciou os estudos. Contudo, se tivesse escolha, Lídia diz que não matricularia a filha nos estabelecimentos públicos. “Eu faria aquele ensino em casa, sabe?”, conta.
Há um motivo por trás dessa opção: ela se preocupa com um eventual contato da filha com as drogas durante o período em que estiver estudando: “A gente vive em um país subdesenvolvido, né? Por conta disso, é até muito fácil encontrar drogas em qualquer lugar. Gostaria de educar minha filha em casa para protegê-la do mal”.
Embora considere a oferta de vagas em creches e em escolas satisfatória, ela acha que o ensino de Pauini não atinge a total qualidade por falta de força de vontade das pessoas que ocupam cargos eletivos. Isso porque, segundo ela, as pessoas que não têm condição de arcar com a mensalidade de uma boa faculdade acabam sem possibilidade de dar continuidade à formação. “Por ser uma cidade de difícil acesso, fica difícil ter muitas oportunidades”, lamenta.
A falta de estrutura para quem quer continuar a estudar é um dos motivos da apreensão da artesã com a cidade em que vive. “Eu não sei o que minha filha vai querer ser da vida quando se formar no ensino médio, se ela vai querer fazer uma faculdade mais complexa ou mesmo uma licenciatura. São oportunidades diferentes, entende? Porque quem cresce com uma estrutura boa para fazer uma faculdade melhor consegue. Quem não tem precisa ralar um pouco mais e estudar e quem quer se encaixar no sistema precisa ralar mais ainda”, pondera.
A escassez de oportunidades de ensino e o tamanho das instalações físicas das escolas, na visão dela, são algumas das principais discrepâncias entre a capital Manaus e o município sul-amazonense. “Os professores [de Manaus] devem ser mais qualificados porque têm mais acesso à educação, a cursos profissionalizantes e à pós-graduação. Aqui [em Pauini] não, a gente não tem. Tem de sair daqui para poder fazer, deixar a família”, relata Lídia.
É uma realidade que pode ser modificada por meio do voto e da participação do eleitorado nas eleições. Antes de escolher uma candidatura, Lídia avalia quais são as proposições apresentadas para a área de educação. Para ela, as pautas mais urgentes são a capacitação dos professores, a construção de mais escolas e a instalação de uma faculdade pública na localidade.
Quando deposita sua confiança e seu voto em determinada pessoa, Lídia diz esperar, ao menos, que ela cumpra com o que foi prometido durante a campanha eleitoral. Ela também almeja que haja um atendimento especializado para as pessoas com deficiência que estudam em instituições mantidas pelo município.
Série “O que o eleitor quer quando pensa em democracia?”
A menos de três meses das eleições municipais, chegou a hora de não somente candidatas e candidatos prepararem suas melhores propostas de governo, mas também de eleitoras e eleitores pensarem sobre o que esperam dos futuros gestores.
Saúde, educação, moradia e propostas factíveis são algumas das prioridades do eleitorado. Como cidadãs e cidadãos esperam que a democracia e, sobretudo, as eleições contribuam para que suas expectativas sejam atendidas?
A partir desta semana, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) publica a série de reportagens “O que o eleitor quer quando pensa em democracia?”, com o objetivo de realçar a importância do processo democrático no debate de ideias e propostas acerca de temas fundamentais para a sociedade.
BA/LC, DB – TSE