Por Rogério Tadeu Romano*
Segundo o que informou o portal de notícias da CNN Brasil, em 12.09.23, “o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) corre o risco de perder o posto e a patente de capitão reformado do Exército, além de suas condecorações, explicam fontes militares.”
A Lei 14.688, de 2 de dezembro de 2023 assim dispõe:
Art. 99. A perda de posto e patente resulta da condenação a pena privativa de liberdade por tempo superior a 2 (dois) anos, por crimes comuns e militares, e importa a perda das condecorações, desde que submetido o oficial ao julgamento previsto no inciso VI do § 3º do art. 142 da Constituição Federal.” (NR)
Tem-se da Constituição:
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
….
- 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
…..VI – o oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em tempo de guerra; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
Trata-se de efeito da condenação penal.
A Justiça Militar, onde houver, ou o Tribunal de Justiça são competentes para decidir sobre a perda do posto e da patente ou da graduação da praça militar em casos de oficiais com sentença condenatória, independentemente da natureza do crime cometido.
“Nada obsta ao Tribunal de Justiça Militar Estadual, após o trânsito em julgado da ação penal condenatória e por meio de procedimento específico, que examine a conduta do militar e declare a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças como sanção secundária decorrente da condenação à luz do sistema de valores e do código de ética militares”, disse o ministro Alexandre de Moraes em seu voto.
O tribunal fixou a seguinte tese:
1) A perda da graduação da praça pode ser declarada como efeito secundário da sentença condenatória pela prática de crime militar ou comum, nos termos do art. 102 do Código Penal Militar e do art. 92, I, “b”, do Código Penal, respectivamente.
2) Nos termos do artigo 125, §4º, da Constituição Federal, o Tribunal de Justiça Militar, onde houver, ou o Tribunal de Justiça são competentes para decidir, em processo autônomo decorrente de representação do Ministério Público, sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças que teve contra si uma sentença condenatória, independentemente da natureza do crime por ele cometido.
A discussão se deu no ARE 1.320.744.
Sobre isso já decidiu o STF:
PENAL E POCESSUAL PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PENA DE EXCLUSÃO DOS QUADROS DA POLÍCIA MILITAR ESTADUAL. PROCEDIMENTO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. PENA ACESSÓRIA DE APLICAÇÃO AUTOMÁTICA. PRECEDENTE DO PLENÁRIO DO STF (RE 447.859, REL. MIN. MARCO AURÉLIO). 1. Após o julgamento do RE 447.859 (Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Plenário, DJe de 20/8/2015), o órgão máximo desta CORTE decidiu, por maioria, que a pena acessória prevista no art. 102 do Código Penal Militar (CPM), além de possuir plena eficácia, aplica-se de maneira automática e imediata, sendo desnecessário, portanto, a abertura de processo específico para tanto. 2. Agravo Regimental a que se nega provimento. (ARE 1.317.262-AgR/MS, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, DJe de 05/05/2021);
DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PERDA DA FUNÇÃO. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1. A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que, sendo competente a Justiça comum para o julgamento do feito, será competente também para decretar a perda do cargo público como efeito da condenação. Precedentes. 2. O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 447.859, Rel. Min. Marco Aurélio, fixou entendimento no sentido de que não é necessário processo específico para a perda da graduação de praça da Polícia Militar, nos termos do art. 125, §4º, da Constituição . 3. Inaplicável o art. 85, §11, do CPC/2015, uma vez que não é cabível, na hipótese, condenação em honorários advocatícios (arts. 17 e 18, Lei nº 7.347/1985). 4. Agravo interno a que se nega provimento. (ARE 1.329.738-AgR/TO, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 15/12/2021)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO CRIMINAL COM AGRAVO. POLICIAIS MILITARES CONDENADOS POR HOMICÍDIO E ABUSO DE AUTORIDADE PELO TRIBUNAL DO JÚRI. PERDA DA GRADUAÇÃO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – De acordo com a jurisprudência desta Corte, no caso de condenação criminal, compete à Justiça Militar decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e a perda da graduação das praças quando se tratar de crimes militares. Já no caso de condenação de oficiais ou praças das forças militares estaduais por crime comum, cabe à Justiça Comum decretar a perda do cargo público com base no disposto no art. 92, I, b, do Código Penal. Precedentes. II – Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 1.020.602-AgR/MG, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 21/10/2020
A ausência de declaração da perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças, como efeito secundário da condenação pela prática de crime militar ou comum, não impede a análise do fato e a posterior deliberação sobre a perda do posto/patente/graduação pelo Tribunal Militar Estadual, em procedimento específico, à luz dos valores e do pundonor militares , posto que a ” competência conferida à Justiça Militar pelo art. 125, §4º, da Constituição, é relativa à perda de graduação como pena acessória criminal ” (ARE 691.306-RG/MS, Rel. Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, DJe de 11/09/2012).
Na matéria disse bem Rodrigo Foureaux (A impossibilidade de juízes condenarem oficiais das instituições militares à perda do posto e da patente):
“A condenação de um oficial à perda do posto e da patente implica na perda do cargo, pois perde a condição de oficial que é necessária para o exercício de cargo militar para o qual prestou concurso público.”
Volto-me a lição de Rodrigo Foureaux (obra citada) quando disse:
“Ao condicionar o julgamento por um tribunal militar tem por finalidade permitir que juízes que possuam toda uma experiência da caserna possam analisar melhor os fatos e se o oficial é digno de permanecer na instituição, em uma ponderação de valores e análise de todo o histórico do oficial e da gravidade do fato praticado. Na impossibilidade do oficial ser julgado por tribunal militar, deve ser julgado por tribunal de justiça comum, cujos julgadores, por serem de segunda instância, possuem toda uma experiência de vida, o que pode permitir a realização de um julgamento mais equilibrado, somado ao fato de haver maior segurança jurídica na aplicação da perda do posto e da patente, por se tratar de decisão colegiada por tribunal.”
Tem-se que em termos criminais, a perda do posto e da patente ocorrerá sempre que a condenação for superior a dois anos.
*É procurador da república aposentado com atuação no RN.
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