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Reforma do STF: Pela Constituição, Contra os Juízes de Si Mesmos

*Por Francisco Welithon da Silva

O Supremo Tribunal Federal atravessa uma crise silenciosa, mas profunda. Não é uma crise provocada por ataques externos, nem por contestação popular à sua legitimidade institucional – mas por algo mais grave: a erosão interna da confiança, fruto de decisões contraditórias, julgamentos politizados e posturas individualistas de alguns de seus membros.

A corte que deveria ser a guardiã da Constituição tem, por diversas vezes, abandonado esse papel em troca de holofotes, retóricas inflamadas e protagonismo político. Os casos do mensalão, da Lava Jato e dos julgamentos envolvendo o ex-presidente…


A chamada “Lei Magnitsky” surgiu nos Estados Unidos como um poderoso instrumento de política externa e proteção de direitos humanos, autorizando sanções a indivíduos estrangeiros considerados responsáveis por violações graves desses direitos ou por atos significativos de corrupção. Embora inicialmente voltada à repressão de abusos cometidos por autoridades russas, sua expansão — especialmente com o Global Magnitsky Act — tornou-se uma ferramenta de alcance mundial. Mas qual a sua efetividade no contexto brasileiro? Teria tal legislação aplicabilidade prática frente às nossas autoridades e instituições? E mais: como ela se articula com a chamada Nova Ordem Mundial e o nosso ordenamento jurídico?

  1. Origem e Propósitos da Lei Magnitsky

A Lei Magnitsky recebeu esse nome em memória do advogado russo Sergei Magnitsky, que morreu sob custódia do Estado após denunciar um grande esquema de corrupção envolvendo funcionários públicos. Sua morte gerou comoção internacional e impulsionou a criação de uma legislação que ultrapassasse fronteiras nacionais para punir abusos, ainda que estes fossem praticados dentro de regimes soberanos.

Nos Estados Unidos, essa lei permite ao governo aplicar sanções como bloqueio de bens e proibição de entrada no país a indivíduos acusados de corrupção ou violação de direitos humanos. Posteriormente, países como Reino Unido, Canadá e membros da União Europeia adotaram legislações semelhantes. Surge então a ideia de uma jurisdição moral supranacional — um reflexo direto da reconfiguração geopolítica do planeta.

  1. A Nova Ordem Mundial e o Deslocamento do Poder Jurídico

A Nova Ordem Mundial — conceito tão debatido quanto controverso — aponta para a centralização de poder em organismos e coalizões transnacionais que, a pretexto da proteção global de direitos e da manutenção da paz, acabam por interferir nas soberanias nacionais. A Lei Magnitsky é um exemplo claro dessa nova dinâmica: é a jurisdição de um país incidindo, de forma extraterritorial, sobre indivíduos de outro, inclusive agentes públicos e autoridades.

Neste cenário, o Brasil, como signatário de tratados internacionais de direitos humanos, se vê em uma encruzilhada: ao mesmo tempo em que deve zelar pela soberania nacional, também assume compromissos com os sistemas de proteção internacional.

  1. Aplicabilidade (ou Inaplicabilidade) no Brasil

Do ponto de vista estritamente jurídico, a Lei Magnitsky não possui força normativa interna no Brasil, salvo em casos de tratados multilaterais que tenham sido ratificados e internalizados com status constitucional ou supralegal. No entanto, os efeitos de tal legislação podem atingir cidadãos brasileiros — inclusive autoridades públicas — indiretamente, por meio de sanções unilaterais impostas por países como os EUA ou por pressões de organismos internacionais.

A jurisprudência brasileira, especialmente após a Constituição de 1988, reforça a soberania nacional e a legalidade estrita das punições. Assim, qualquer tentativa de sanção interna baseada exclusivamente em dispositivos como a Lei Magnitsky seria inconstitucional sem previsão legal expressa. Por outro lado, a pressão internacional pode sim comprometer a reputação e a mobilidade internacional de agentes públicos brasileiros, mesmo que estes não tenham sido julgados ou condenados no Brasil.

  1. Quando o Direito Internacional Encontra a Política Externa

O uso da Lei Magnitsky tem se revelado não apenas jurídico, mas também fortemente político. Em nome da moralidade internacional, países aplicam sanções seletivas, geralmente voltadas a figuras de regimes considerados “inimigos” ou “não alinhados” com interesses hegemônicos. Nesse contexto, emerge um risco: o enfraquecimento do princípio da isonomia entre nações e a relativização do devido processo legal — principalmente quando os alvos das sanções sequer têm direito à ampla defesa.

Esse cenário suscita uma preocupação legítima: será a Lei Magnitsky uma verdadeira ferramenta de justiça universal, ou mais uma engrenagem de coerção geopolítica?

  1. Riscos e Precedentes para o Brasil

Na hipótese de autoridades brasileiras — sejam juízes, procuradores, parlamentares ou chefes do Executivo — serem alvo de investigações ou acusações internacionais, a aplicação da Lei Magnitsky poderia comprometer a atuação diplomática, política e econômica do país. Em especial, se tais sanções partirem de denúncias não comprovadas ou forem utilizadas como instrumentos de pressão política sobre decisões judiciais, legislativas ou administrativas internas.

É também inevitável perguntar: se houvesse interesse político suficiente, a Lei Magnitsky poderia ser usada contra autoridades brasileiras envolvidas em escândalos como Lava Jato, mensalão ou Orçamento Secreto? E, nesse caso, estariam essas autoridades sujeitas a um julgamento moral supranacional, à margem da nossa Constituição?

  1. Considerações Finais

A Lei Magnitsky representa uma tendência crescente de transnacionalização da justiça, sob a justificativa da proteção universal dos direitos humanos. No entanto, sua aplicabilidade ao Brasil encontra limites constitucionais, legais e diplomáticos. É preciso cautela para que essa legislação, apesar de bem-intencionada em sua origem, não se converta em instrumento de ingerência indevida e punição política seletiva.

No contexto da Nova Ordem Mundial, cabe ao Brasil manter firme seu compromisso com os direitos humanos, mas sem abrir mão da soberania e da independência dos seus Poderes. Um Estado Democrático de Direito não pode terceirizar sua jurisdição — tampouco permitir que suas instituições sejam julgadas por interesses estrangeiros travestidos de justiça global.

*Dr. Francisco Welithon da Silva
Advogado, Escritor, pesquisador, Especialista e Direito Processual (penal, Civil e Administrativo) e, Doutor em Direito Penal pela Universidade do Museu Social Argentino – UMSA.

04.08.2025

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